Archive for janeiro 2008

O Relógio - Parte 2


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John fitou o pedaço de papel, de fato, nele estavam escritas algumas instruções. Ele riu e pensou que talvez aquilo não passasse de peça do velho. Seria bem provável já que ele o teria conhecido um dia antes e ainda não confiava nele. Mas e se fosse verdade? Se aquela letra garranchada e aqueles passos mostrassem realmente como se montasse um relógio mágico? Seria tolice tentar?

O jovem colocou o pedaço de papel no bolso e se dirigiu ao porão. Era um lugar escuro, úmido e com muitas quinquilharias. Era ali que John se afastava do mundo e ia fazer o que mais gostava: fabricar relógios. Em toda aquela técnica ele via algo de sensacional, algo que lhe dava prazer. Quando era ainda criança, aprendeu a consertar relógios com seu avô, não tardou, aprendeu a fabricá-los. Sentia-se realmente importante naquele momento. Sentia que suas mãos eram instrumentos divinos, embora não tivesse deixado de acreditar em Deus depois que sua amada esposa falecera. Às vezes, quando estava sozinho em sua cama e não conseguia dormir, lembrava do sorriso de Beatrice: como ela era doce. Nem quando estava com raiva dele, quando ficava até tarde trabalhando, ela era rude. De tão delicada, parecia uma rosa.

John se sentia culpado pela morte da esposa. Embora o médico tenha feito todo o necessário para deixar sua esposa viva, ela não resistiu. Chegou a amaldiçoar seu filho, que tirou a vida de sua amada. Mas Beatrice queria tanto um filho que ele se sentia obrigado a isso. Talvez ela desejasse tanto por não receber a devida atenção do esposo. E de fato, isso acontecia. A bela sentia-se sozinha e isso era claramente observado. Quando viu a barriga crescendo, se encheu de alegria, parecia uma outra mulher. Tudo era o bebê. Tudo era para o bebê. John chegou a sentir ciúmes da criança, pois aquele “forasteiro”, como se referia ao filho, era mais merecedor da atenção de Beatrice que ele.

John parou um instante de consertar o relógio do Mr. Jakes, olhou em volta e pensou que talvez aquele bilhete não fosse uma simples brincadeira. Seria provável que Sali tivesse deixado para ele a receita da felicidade. Pensou que talvez, com esse relógio mágico nas mãos, pudesse recuperar a esposa que tanto amava. Ele pegou o bilhete do bolso e começou a ler. Arrumou as peças e os instrumentos de que iria precisar e começou o trabalho.

O jovem trabalhou duas semanas sem parar. Parecia que o relógio não queria ficar pronto. Quando os ponteiros enfim se mexeram, John mal conseguia segurar as lágrimas. Imediatamente ele pensou no que iria fazer, será que voltar no tempo e não deixar que Beatrice engravidasse seria uma boa idéia. Ele pensou e decidiu: voltaria no tempo e recuperaria a vida de antes ao lado de sua amada e não permitiria jamais que ela engravidasse.

Não tardou e John estava com o relógio mágico na mão e pronto para a viagem no tempo...

O Relógio - Parte 1


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John Walter morava no subúrbio da Inglaterra. Era um homem bom e dizia-se que era o maior e melhor relojoeiro do país. Pelas suas mãos já tinham passados os relógios mais importantes do mundo, inclusive o relógio de do Rei Jaime I, no ano de 1615.

Em um dia gelado de inverno, John recebeu uma visita inesperada. Era um pobre senhor que batia em sua porta pedindo abrigo.

- Boa Noite jovem. Meu nome é Sali. Sou forasteiro, vim da Irlanda, da cidade de Dublin. Viajei de navio e a cavalo para chegar até aqui. Quando já estava próximo dos portões, dois ladrões me roubaram e levaram meu cavalo. Será que o cavalheiro poderia me dar abrigo durante esta noite?

- Sim, claro - disse John comovido com a história.

O velho Sali era um mercador árabe. Ele estava fazendo uma viagem pelo mundo e procurava os produtos mais maravilhosos para comprar e depois vendê-los para reis e rainhas. Sali tinha uma grande barba branca, era corcunda e tinha uma voz muito grave. Usava uma manta enrolada na cabeça e outra pelo corpo.

John ofereceu ao velho caldo de carne de porco que ele mesmo tinha preparado, pois era viúvo. Sua esposa e seu filho morreram no parto há exatamente 7 anos. Embora jovem e com boa vida, não se casou novamente.

À beira da lareira, John e Sali conversavam:

- Você é sozinho jovem? Onde está sua esposa? - perguntou o velho senhor

- Ela faleceu no parto há sete anos, levando junto meu filho.

- E por que não mais se casou?

- Não quero que isso aconteça de novo. Sofri muito e prefiro me concentrar em meu trabalho.

- E o que você faz?

- Sou relojoeiro. Fabrico relógios para os cavalheiros daqui, de Blackpool.

- É uma bela profissão. Senhor do tempo. O que ninguém pode duvidar é da existência do tempo. Sabe jovem, sou bastante velho e já conheço quase todo o mundo - afirmou Sali com que se gabando. Já visitei muitos países e conheci muita gente por aí. Quando tinha menos idade, conheci um velho na Alemanha, ele me parecia cheio de sabedoria. Ele era relojoeiro, assim como você, mas ele tinha algo de especial.

- O que ele tinha de especial velho? - indagou John duvidando daquela afirmação.

- Ele mandava no tempo.

John balançou a cabeça, como quem não entende.

- Vou explicar - continuou Sali. Ele sabia parar, antecipar e atrasar o tempo. Ele tinha um relógio mágico. Era como esses que você vê por aí nas ruas, mas ele tinha três botões: um que parava o tempo, outro que adiantava e outro que atrasava.

- O senhor deve estar cansado da viajem e está pensando em coisas que não existem. Vou preparar um local para o senhor dormir.

- Jovem tolo. Não vê o que eu estou lhe dizendo? É uma história verdadeira. Eu não acreditaria se não tivesse visto com meus próprios olhos. De fato, estou cansado, irei me deitar. Mas, amanhã contarei a você como era fabricado esse relógio.

- Sim senhor. Vou preparar sua cama.

Enquanto saía da sala, John se perguntava: "Será verdade o que aquele velho está dizendo ou estará ele querendo me pregar uma peça?". Os dois foram deitar. Já era tarde e John teria muito trabalho no dia seguinte.

De manhã cedo, John se levantou, preparou um café e arrumou a mesa. Ele caminhou até a sala, onde estava dormindo Sali, próximo à lareira, mas ele não estava mais lá. Só haviam os lençóis e a manta usada pelo velho. Próximo dali, já mais perto da lareira, havia um bilhete. Ainda estava com a tinta fresca, o que fez John pensar que o velho teria saído há pouco tempo. No pedaço de papel estava escrito.

"Jovem,

Você me foi muito útil nesta noite deixando que eu pernoitasse em sua casa. Sou-lhe muito grato por isso.

Ontem, lhe falei de um relojoeiro alemão. Você se lembra? Neste papel, deixo escritas no verso as orientações para se preparar um relógio igual aos que ele fazia. Não ignore isso. É um presente por ter sido gentil comigo. Leia com atenção e não se arrependerá.

Um sincero obrigado do vendedor mais conhecido as arábias,

Sali.”

John ficou um tempo olhando para aquele bilhete e quando virou o pedaço de papel...

Sobre a autora


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Nome: Camilla Viégas
Nascimento: 1988
País: Brasil


Sou uma constante transição. Encontro conforto nas palavras que me cercam e procuro tranformá-las em texto. Tudo são palavras, se você não as vê é porque não abriu os olhos ainda.
Não vivo sem um livro, sou apaixonada por eles, e amo fotografia.
Tento escrever histórias maravilhosas. Às vezes consigo.

Camilla Viégas é jornalisa e blogueira desde 2003.

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